Recurso na Representação nº
1825-24/DF
Relator originário: Ministro Aldir
Passarinho Junior
Relator para o acórdão: Ministro
Marcelo Ribeiro
RECURSO. REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES
2010. PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA. TWITTER. CARACTERIZAÇÃO. ARTS.
36 E 57-A DA LEI Nº 9.504/97. NÃO PROVIMENTO.
1. O Twitter é meio apto à
divulgação de propaganda eleitoral extemporânea, eis que amplamente utilizado
para a divulgação de ideias e informações ao conhecimento geral, além de
permitir interação com outros serviços e redes sociais da internet.
2.
Constitui propaganda eleitoral extemporânea a manifestação veiculada no período
vedado por lei que leve ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada,
futura candidatura, ação política que se pretende desenvolver ou razões que
levem a inferir que o beneficiário seja o mais apto para a função pública.
3. Na espécie, as mensagens
veiculadas no Twitter do recorrente em 4 de julho de 2010 demonstraram,
de forma explícita e inequívoca, a pretensão de promover sua candidatura e a de
José Serra aos cargos de vice-presidente e presidente da República nas Eleições
2010.
4. Caso, ademais, em que “o
representado não optou por restringir as mensagens contidas em sua página,
permitindo que qualquer pessoa, ainda que não cadastrada no twitter,
tivesse acesso ao conteúdo divulgado” (excerto da decisão singular do e.
Min. Henrique Neves).
5. Recurso desprovido.
Acordam os ministros do Tribunal
Superior Eleitoral, por maioria, em desprover o recurso, nos termos das notas
de julgamento.
Brasília, 15 de março de 2012.
MINISTRO
MARCELO RIBEIRO – RELATOR PARA O ACÓRDÃO
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR:
Senhor Presidente, cuida-se de recurso interposto por Antonio Pedro de Siqueira
Índio da Costa contra decisão que julgou procedente representação para
condená-lo à sanção de multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por propaganda
eleitoral antecipada realizada na internet via Twitter.
Na decisão recorrida (fls. 50-58), da lavra
do Min. Henrique Neves1, juiz auxiliar desta c. Corte nas eleições de
2010, consignou-se que as mensagens veiculadas na mencionada ferramenta
evidenciaram a pretensão do ora recorrente de divulgar candidatura aos cargos
de presidente e vice-presidente da República nas Eleições 2010 em período
anterior a 5 de julho, violando assim o art. 36 da Lei nº 9.504/97.
Nas razões recursais, aduz-se essencialmente
o seguinte (fls. 62-75):
a) o Twitter constitui ferramenta de
comunicação de ambiente restrito, uma vez que o acesso ao respectivo sítio e o
ato de seguir determinada pessoa dependem de exclusiva vontade do internauta;
b) os internautas não cadastrados no Twitter
somente têm acesso às 20 mensagens mais recentes de cada usuário, não sendo
possível, após determinado espaço de tempo, a pesquisa ou leitura dessas;
c) a mensagem impugnada, ainda que tenha
extrapolado os limites legais, não foi divulgada a todos os 40.676 seguidores
do recorrente por se tratar de resposta dirigida especificamente a um
internauta, a qual só pode ser recebida “pela própria pessoa que iniciou a
conversa, ou por aqueles usuários que sigam, simultaneamente, as duas pessoas
que travam a conversa” (fls. 68-69);
d) o debate online entre internautas
não pode ser considerado propaganda eleitoral, pois equivale a mero diálogo
entre duas ou mais pessoas;
e) “a resposta postada pelo twitteiro a uma pergunta de um interlocutor seu, [sic] não
pode ser considerada como ato que leva ao conhecimento geral uma candidatura e
as suas propostas” (fl. 68), uma vez que o Twitter é constituído por
comunidade de usuários previamente estabelecida;
f) a mensagem, no contexto de sua
veiculação, guarda semelhança com as entrevistas dadas a grandes meios de
comunicação, em relação aos quais o c. Tribunal Superior Eleitoral já se
manifestou no sentido de não configurarem propaganda antecipada;
g) “o tema político foi trazido pelo
internauta e não propriamente pelo recorrente, que apenas respondeu às
mensagens que lhe foram feitas” (fl. 72);
h) o reconhecimento do ato impugnado como
propaganda extemporânea violou os arts. 5º, IV, e 220 da Constituição Federal
e, por conseguinte, ofendeu a livre manifestação de pensamento e de crítica.
Ademais, a candidata Dilma Rousseff veiculou em sua página do Twitter mensagens
de teor semelhante antes de 6 de julho de 2010.
Ao fim, requer-se o provimento do recurso,
com a consequente reforma da decisão monocrática.
Contrarrazões apresentadas às fls. 78-83,
nas quais o Ministério Público Eleitoral sustenta que:
a) as mensagens impugnadas não representam
simples diálogo entre internautas e, ainda que tenham constado somente das 20
mensagens mais recentes da página do recorrente no Twitter, podem ter
sido acessadas por milhares de pessoas, levando ao conhecimento geral o pedido
de votos formulado;
b) “não pode ser considerado mera
expressão da liberdade de pensamento o fato de um candidato a cargo eletivo
postar na internet pedido expresso de votos, por
meio de mensagem que pode ser acessada por milhares de pessoas, pois representa
um atentado direto à isonomia entre os candidatos, e por via de consequência, à
própria democracia” (fl. 82);
c) condutas praticadas por outros candidatos
na propaganda eleitoral, as quais supostamente guardam semelhança com o caso
dos autos, não são aptas a justificar os atos do recorrente na espécie.
O feito foi a mim redistribuído em
22.12.2010 (fl. 91).
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR
(relator): Senhor Presidente, cuida-se de recurso interposto por Antonio Pedro
de Siqueira Índio da Costa, candidato à vice-presidência da República nas
eleições de 2010, contra decisão prolatada pelo Min. Henrique Neves que julgou
procedente representação para condená-lo à sanção de multa de R$ 5.000,00
(cinco mil reais) por propaganda eleitoral antecipada realizada na internet via
Twitter, sob os seguintes fundamentos (fls. 50-58):
“Decido.
Julgo procedente, em parte, a
representação, aplicando ao representado multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco
mil reais).
Inicialmente, entendo que a concepção
trazida pelas partes sobre a ferramenta „twitter‟,
ainda que parcialmente correta, não é completa.
Mesmo que várias pessoas considerem o „twitter‟ uma rede de interação, um dos seus criadores, o
americano Jack Dorsey, declarou ao jornal espanhol „El País‟ não considerar o twitter
uma rede social, mas uma ferramenta de comunicação. Do mesmo modo, outro
cocriador, Biz Stone, afirma que a ferramenta é uma rede de informações.
Estudos realizados em diversos países
concluem que a ferramenta desenvolvida está mais para um meio de difusão do que
uma conversa
íntima entre amigos, ainda que não seja
possível negar que ela também apresenta, em alguns casos, características de
interação que definem uma rede social.
Nesse aspecto, não há como
simplesmente considerar que o uso do twitter,
especialmente nas campanhas eleitorais, está direcionado apenas à interação e
‘troca de ideias em ambiente restrito às pessoas previamente cadastradas’, como
afirma a defesa.
O acesso às páginas de divulgação de
qualquer usuário do twitter independe de prévio
cadastramento. Basta digitar a URL que o
acesso à página é franqueado. O livre acesso ao conteúdo, contudo, pode ser
restringido pelo usuário, mediante a edição de suas preferências na utilização
da ferramenta. Caso opte por essa restrição, terceiros não cadastrados terão
acesso apenas a alguns dados do usuário e à informação que ele optou proteger
seus tweets.
No caso, o representado não optou por
restringir as mensagens contidas em sua página, permitindo que qualquer pessoa,
ainda que não cadastrada no twitter, tivesse
acesso ao conteúdo divulgado.
Por outro lado, a ferramenta utilizada
permite que o usuário siga a página de outras pessoas, o que significa dizer
que qualquer mensagem inserida na página seguida também será quase que
instantaneamente exibida na página do seguidor. Inversamente, isso significa
que toda e qualquer mensagem introduzida pelo usuário em sua página será
exibida em todas as páginas das pessoas que o seguem.
No caso do representado, como se
verifica do documento de fls. 9, no momento das transmissões contestadas pela
inicial, ele seguia 897 usuários, era seguido por 40.677 pessoas e fazia parte
de 685 listas de interesse.
Em outras palavras, ao inserir uma
mensagem em sua página no twitter, o
representado, ao invés de simplesmente interagir com um único usuário, divulgou
para outros 40.676 a mesma informação.
Nessa proporção não se considera a
réplica da mensagem que comumente ocorre com o uso da função „retweet‟, por meio da qual qualquer usuário pode incluir a
mensagem recebida em sua página, atribuindo o crédito ao autor original e
divulgando-a para aqueles que o seguem, elevando a divulgação de forma
exponencial.
Em razão dessas características,
entendo não ser possível acatar os argumentos da defesa no sentido da
divulgação do conteúdo inserido pelo representado não pretender atingir o
conhecimento geral da sociedade.
Por outro lado, com a devida vênia,
entendo não existir semelhança entre o uso da ferramenta de divulgação com as
entrevistas realizadas pelos meios de comunicação social, as quais partem de um
interesse social previamente identificado pelo órgão de imprensa que busca a
informação e a transmite para a sociedade. No twitter,
a via é inversa, o usuário é que seleciona o que considera como interessante e
leva ao conhecimento da sociedade suas mensagens.
O argumento de o acesso à página
depender da vontade do usuário também não se aplica ao meio de comunicação
utilizado. Como já delineado acima, o acesso independe de cadastro, as
mensagens são instantaneamente copiadas para as páginas dos seguidores e,
possivelmente, são replicadas para tantas outras.
Ademais, ‘o fato de o acesso a
eventual mensagem contida em sítio da Internet depender
de ato de vontade do internauta não elide a possibilidade de caracterização da
propaganda eleitoral extemporânea’ (REspe nº
21.661, rel. Min. Peçanha Martins, de 26.8.2004, também citado na decisão
monocrática no REspe 28.435, rel. Min. Caputo Bastos, DJ 6.6.2008).
Em relação ao trecho destacado pela
defesa do voto por mim proferido no julgamento do Agravo Regimental na Ação
Cautelar nº 1384-83, verifico que o mesmo não tem aplicação ao caso. A situação
dos autos não trata de manifestações de apoio ou opinião pessoal de terceiros.
Aqui o autor das mensagens é o próprio candidato.
Com essas razões, tenho inicialmente
como certo que as mensagens divulgadas pelos candidatos, por intermédio do twitter, podem ser examinadas pela Justiça Eleitoral, para o fim
de verificar se há ou não irregularidade capaz de gerar sanção.
No caso, portanto, é necessário analisar
o conteúdo das mensagens destacadas na inicial.
A análise, conquanto possa sofrer algum
temperamento em razão das comunicações travadas com terceiros, como quer a defesa,
não deve ser centrada exclusivamente nesse aspecto, pois nem sempre a
„pergunta‟ é divulgada pelo responsável na página em que é incluída a resposta.
É o caso dos autos. Pela análise do
documento de fl. 9, o representado divulgou apenas as respostas por ele
inseridas, sem replicar a pergunta que, agora, afirma ter sido lhe endereçada.
Nesse contexto, das cinco mensagens
apontadas na inicial, verifico que as frases „A mobilização aqui na rede fará a
diferença, conto com você‟, „Juntos aqui na rede faremos a diferença‟ e „Conto
com você‟ são genéricas e podem possuir diversos significados, não sendo
possível, sem uma dose exagerada de subjetivismo, considerá-las como propaganda
eleitoral.
A segunda mensagem transcrita na inicial
(„Vou dar tudo de mim. Vamos para as ruas eleger Serra Presidente‟), conquanto
contenha referência à eleição de José Serra, pode ser considerada como mera
proposta de atuação pessoal.
Dessa forma, tenho que as quatro
últimas mensagens indicadas na inicial não traduzem propaganda eleitoral
irregular.
Porém, considero que, na primeira
mensagem, o representado pede explicitamente apoio e voto, além de divulgar
lema de campanha presidencial. Eis o teor:
‘A responsabilidade é enorme. Mas
conto com o seu apoio e com o seu voto. Serra Presidente: O Brasil pode mais’.
A defesa reconhece o teor da mensagem
e argumenta que ela teria sido postada a partir de comentário do usuário
CelsoJFerreira, que disse: ‘Prepare-se. Ser vice não é fácil’.
Não há completa correlação entre as
mensagens. O usuário afirmou as dificuldades inerentes ao exercício do cargo de
Vice-Presidente, dizendo ao representado para se preparar. Na resposta houve o
reconhecimento da alta responsabilidade que o cargo exige. Até aí, há
correlação temática. Mas, o representado foi além, e independentemente da
responsabilidade pelo exercício do cargo, pediu apoio e voto (conto com o seu
apoio e seu voto). E, em seguida, divulgou lema de campanha: ‘Serra Presidente:
o Brasil pode mais’.
Sobre a identidade da locução ‘o Brasil
pode mais’ com a eleição presidencial, basta verificar a coincidência desse
lema com o nome da Coligação pela qual o registro do candidato foi requerido.
Considero, portanto, que, ao divulgar
tal mensagem, o representado antecipou a propaganda eleitoral e o pedido de
votos que somente é permitido depois do dia 5 de julho, a teor do que dispõem
os arts. 36-A e 57-A da Lei 9.504/97.
Por fim, registro que as referências
feitas às mensagens postadas por outros candidatos na mesma ferramenta não
constituem objeto da presente ação e, como tal, não devem ser aqui analisadas.
Por essas razões, julgo a
representação procedente e, não identificando elementos capazes de autorizar a
fixação da multa acima do mínimo legal, condeno o representado ao pagamento de
multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).” (destaquei).
De início, observa-se que o recorrente, na
primeira parte de seu recurso, tece considerações a respeito das
funcionalidades e características do Twitter, as quais teriam
repercussão no caso concreto para afastar a ilegalidade da propaganda.
No entanto, tais alegações não merecem
prosperar.
I. Alcance do Twitter
As mensagens veiculadas na ferramenta de
comunicação Twitter alcançam não apenas os seguidores cadastrados, mas
qualquer internauta que acesse o sítio, não havendo falar, assim, em ambiente
restrito.
Ademais, a possibilidade de interação com
outros serviços da internet, a exemplo de programas de mensagens instantâneas,
correios eletrônicos, blogs e outras redes sociais, contribui para o
alcance das informações postadas na referida ferramenta. Nesse sentido, a
decisão monocrática prolatada na Rp nº 5408-91/SP, Rel. Min. Joelson Dias,
publicada no Mural de 22.8.2010.
Ressalta-se, ainda, que – contrariamente ao
que sustentado pelo recorrente – os internautas não cadastrados no Twitter têm
acesso não somente às 20 mensagens mais recentes de cada usuário, mas a todo o
seu conteúdo, bastando, para tanto, selecionar a opção “more”,
localizada na parte inferior da respectiva página. Assim, afigura-se plenamente
possível a leitura dessas a qualquer tempo.
Nesse contexto, vale ainda destacar excerto
da decisão do Min. Henrique Neves, ora agravada, verbis: “no caso, o
representado não optou por restringir as mensagens contidas em sua página,
permitindo que qualquer pessoa, ainda que não cadastrada no twitter,
tivesse acesso ao conteúdo divulgado”.
Por fim, a despeito do argumento de que nem
todos os 40.676 seguidores do recorrente foram notificados das mensagens
postadas, não há como desconsiderar a possibilidade de pesquisa e leitura
dessas mediante acesso à respectiva página no Twitter, independentemente
de cadastro prévio.
Portanto, ainda que não se possa falar em
alcance irrestrito das interações entre os usuários do Twitter, é
evidente a potencialidade da ferramenta de levar ao conhecimento geral os
diálogos nela travados.
II. Possibilidade de prática de
propaganda antecipada no Twitter
O fato de o acesso ao Twitter depender
de vontade do internauta não elide a possibilidade de caracterização de
propaganda eleitoral antecipada.
Com efeito, presentes os elementos
caracterizadores da propaganda eleitoral, é irrelevante o meio pelo qual ocorre
sua divulgação, em especial no caso da internet, que representa fonte de
divulgação de ideias e informações em plena expansão. Nesse sentido, os
seguintes precedentes:
“Representação. Propaganda eleitoral
antecipada. Orkut.
[...]
2. As circunstâncias de que o sítio de
relacionamentos teria acesso restrito e se limitaria a integrantes e usuários
previamente cadastrados não afastam a infração legal, uma vez que as redes
sociais na Internet constituem meios
amplamente utilizados para divulgação de idéias e informações, razão pela qual
não deve ser afastada a proibição da norma que veda a antecipação de campanha. [...]”
(AgR-AI nº 10.135/SP, Rel. Min. Arnaldo
Versiani, DJe de 28.9.2010) (destaquei).
“RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÃO 2004.
REPRESENTAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA. UTILIZAÇÃO.
SÍTIO. INTERNET. DEPUTADO ESTADUAL. CANDIDATO.
PREFEITO. USO DO NÚMERO DO PARTIDO. VIOLAÇÃO A NORMA. RECURSO PROVIDO.
I – O fato de o acesso a eventual
mensagem contida em sítio da Internet depender
de ato de vontade do internauta não elide a possibilidade de caracterização da
propaganda eleitoral extemporânea, caso nela conste ‘pedido de votos, menção ao
número do candidato ou ao de seu partido ou qualquer outra referência à
eleição.’ [...]”
(REspe nº 21.661/PB, Rel. Min. Peçanha
Martins, DJ de 8.10.2004) (destaquei).
Ademais, a alegação de que as manifestações
no Twitter seriam similares às entrevistas de futuros candidatos a
grandes meios de comunicação – as quais, por sua vez, não configurariam
propaganda extemporânea – não tem qualquer relação com o caso concreto, mesmo
porque, nos precedentes2 citados na peça recursal para amparar tal
afirmação, considerou-se apenas o conteúdo tido como ilegal, e não a forma de
veiculação.
Desse modo, por se tratar de rede de
informações difundida na internet e que possibilita a interação com diversos
serviços similares, o Twitter viabiliza a prática e a ampla divulgação
de propaganda eleitoral, razão pela qual se inicia o exame da suposta
ilegalidade.
III. Do conteúdo das mensagens impugnadas
Conforme consignado na decisão monocrática,
o recorrente, em 4 de julho de 2010, postou mensagens com suposto conteúdo
eleitoral em sua página do Twitter em resposta a perguntas de outros
usuários cadastrados na referida ferramenta.
O Min. Henrique Neves, ao analisar a
controvérsia, asseverou que quatro das cinco mensagens impugnadas na
representação não configuraram propaganda eleitoral extemporânea em razão de
seu conteúdo genérico e do mero enquadramento como propostas de atuação
pessoal.
Entretanto, a última mensagem ensejou a
procedência da representação, com a consequente imposição de multa pecuniária.
Eis o teor da manifestação (fl. 50):
“A responsabilidade é enorme. Mas conto
com o seu apoio e com o seu voto. Serra Presidente: O Brasil pode mais”.
De fato, verifica-se que a referida mensagem
demonstra, de forma explícita e inequívoca, a pretensão do recorrente – já
escolhido em convenção partidária – de promover sua candidatura e a de José
Serra aos cargos de vice-presidente e presidente da República nas Eleições
2010, inclusive com menção ao slogan de campanha adotado para a eleição.
Por sua vez, a divulgação da mensagem pelo Twitter
– ferramenta de comunicação no âmbito da internet de evidente alcance –
teve o condão de levar ao conhecimento geral do eleitorado a iminente
candidatura.
Consoante entendimento deste c. Tribunal,
constitui propaganda eleitoral antecipada a manifestação veiculada no período
vedado por lei que leve ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada,
futura candidatura, ação política que se pretende desenvolver ou razões que
levem a inferir que o beneficiário seja o mais apto para a função pública.
Nesse sentido:
“[...] 2. Nos
termos da jurisprudência da Corte, deve ser entendida como propaganda eleitoral
antecipada qualquer manifestação que, previamente aos três meses anteriores ao
pleito e fora das exceções previstas no artigo 36-A da Lei nº 9.504/97, leve ao
conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que
somente postulada, a ação política que se pretende desenvolver ou as razões que
levem a inferir que o beneficiário seja o mais apto para a função pública.
3. Conforme jurisprudência da Corte, „a
fim de verificar a existência de propaganda subliminar, com propósito
eleitoral, não deve ser observado tão somente o texto dessa propaganda, mas
também outras circunstâncias, tais como imagens, fotografias, meios, número e
alcance da divulgação‟ (Recurso Especial Eleitoral n° 19.905/GO, DJ de
22.8.2003, rel. Min. Fernando Neves). [...]”
(R-RP nº 1.406/DF, Rel. Min. Joelson Dias,
DJe de 10.5.2010) (destaquei).
Assim, a veiculação de propaganda eleitoral
em período anterior ao pedido de registro de candidatos para as Eleições 2010
violou os arts. 36 e 57-A da Lei nº 9.504/97, os quais dispõem, verbis:
“Art. 36. A propaganda eleitoral somente
é permitida após o dia 5 de julho do ano da eleição”.
“Art. 57-A. É permitida a propaganda
eleitoral na Internet, nos termos desta Lei,
após o dia 5 de julho do ano da eleição.”
IV. Da alegação de ofensa à liberdade de
manifestação do pensamento
Não há falar em ofensa aos arts. 5º, IV3,
e 220 da Constituição Federal4.
Nos termos da jurisprudência desta c. Corte,
as restrições impostas à propaganda eleitoral não afetam os direitos
constitucionais de livre manifestação do pensamento e de liberdade de
informação e comunicação, os quais devem ser interpretados em harmonia com os
princípios da soberania popular e da garantia do sufrágio. Confira-se:
“[...] - As
restrições à veiculação de propaganda eleitoral não afetam os direitos
constitucionais de livre manifestação do pensamento e de liberdade de
informação e comunicação, previstos nos arts. 5º, IV e IX, e 220 da CF, até
porque tais limitações não estabelecem controle prévio sobre a matéria
veiculada. Precedentes da Corte. [...]”
(EAAG nº 7.501/SC, Rel. Min. Gerardo
Grossi, DJ de 5.10.2007) (destaquei).
Por fim, destaca-se ser indevida a
comparação promovida pelo recorrente entre as mensagens ora impugnadas e as
postadas pela então futura candidata Dilma Rousseff no Twitter antes de
5 de julho de 2010, as quais sequer integram o objeto desta representação.
V. Conclusão
Dessa forma, realizada a propaganda em
período anterior ao pedido de registro de candidatura para as Eleições 2010,
não merece reparos a decisão recorrida.
Ante o exposto, nego provimento ao
recurso.
É o voto. VOTO (vencido)
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Senhor
Presidente, quando esse tema foi citado pela primeira vez, discutimos até mesmo
esse ponto, e as consequências desse entendimento seriam gravíssimas, porque o twitter
ser considerado com o mesmo modelo de rede social seria impossível.
Neste caso, peço vênia para me manter fiel
ao modo como votei anteriormente.
Vossa Excelência está provendo o recurso?
O SENHOR MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR
(relator): Estou negando provimento, porque o Ministro Henrique Neves aplicou a
multa.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Divirjo,
então, exatamente no ponto em que se cuida de twitter. Vejo que é caso
de impossibilidade.
VOTO (vencido)
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: Senhor
Presidente, peço vênia ao Ministro Aldir Passarinho Junior e aos que comungam
desse entendimento para acompanhar a divergência iniciada pela Ministra Cármen
Lúcia.
E há algo mais a acrescentar. Eu, por
exemplo, nunca recebi um twitter, porque nunca me cadastrei em nenhum
emissor de twitter e nunca fui à página de nenhum twiteiro.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: E o twitter
pode, inclusive, ser restrito. Pode-se ter o twitter e aceitar, na
lista de contatos, somente as pessoas que se deseja.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: Isso não
caracteriza propaganda.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: É um
encontro muito pequeno.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: O que é o twitter?
É aquilo que podemos chamar de cochicho: uma pessoa cochicha com outra. Seria
necessário, então, impedir que antes do período permitido para propaganda
eleitoral, as pessoas, numa conversa, perguntassem umas para as outras em quem
votarão.
Teríamos, então, que ampliar a Justiça
Eleitoral, Senhor Presidente e nobres colegas, porque não são milhões de twitters
que rodam pela rede, são bilhões, e esse contexto extrapola a rede da
internet e entra também na rede de telecomunicação dos celulares, em que uma
pessoa conversa com outra. É impedir que alguém converse com outrem; é
interferir numa seara absolutamente individual. Não se trata de propaganda; é
liberdade de pensamento e de expressão na sua essência, sendo vedada qualquer
restrição pela Constituição Federal e, neste caso, inclusive, pela Legislação
Eleitoral.
Como vedaremos que alguém converse com outro
por telefone, no período de pré-campanha, pedindo voto para alguém ou falando
mal de outro candidato de quem essa pessoa emissora não goste? Temos condições
de interferir em todas as relações humanas? São essas as questões a se
perguntar.
A Justiça poderá interferir, mesmo que
admitamos – possibilidade que não admito – que esse entendimento seja
propaganda, que essa vedação que se está impondo pela jurisprudência da Corte
seja contrária à liberdade de expressão, de pensamento e de manifestação? Ainda
que venha a entender que tudo isso seja realmente vedado, que não seja
permitido, que não afronte nenhum princípio de manifestação do pensamento e de
liberdade de expressão e de comunicação, teremos estrutura para interferir em
todas as relações humanas? Porque é disto que se trata: de conversa entre seres
humanos.
O twitter é o cochicho. Tanto é que
tem número de caracteres limitado.
Então, teríamos que criar uma grande central
de interceptação de telefone para ver se as pessoas estão se comunicando em
período de pré-campanha e pedindo voto ou falando mal de um candidato
adversário. O caso é mais acachapante ainda que a questão do blog, do
que a questão de manter uma página na internet.
Acompanho a divergência, com as devidas
vênias. E também entendo que se trata de jurisprudência que, se prevalecer,
será em breve superada, porque a vida é dinâmica.
Lembro-me de um habeas corpus do qual
tive a oportunidade de ler acórdão, que foi julgado no Tribunal de Justiça de
São Paulo, na década de 20, ou de 30, em que o impetrante alegava que a
sentença condenatória não era autêntica, porque foi datilografada. Só a
assinatura era do juiz. E como comprovar a autenticidade e a veracidade daquela
sentença?
Recentemente, quando assumi o honroso cargo
de Ministro do Supremo Tribunal Federal, já com o processo eletrônico, tive a
oportunidade de receber a ligação de um Tribunal de Justiça, em relação a uma
decisão concessiva de habeas corpus que eu havia proferido, que
questionava o fato de não haver assinatura na decisão. Pensava-se que a decisão
era falsa porque estava assinada digitalmente.
Temos que nos acostumar com as novas
tecnologias, da mesma forma como no passado, quando causou espécie datilografar
sentença numa máquina de escrever, que poderia trazer uma situação de dúvida
sobre a autenticidade: saber se foi o próprio juiz quem sentenciou ou se foi
alguém que o fez por ele, que simplesmente a assinou, ou saber se aquela
assinatura também era falsa. As novas tecnologias impõem à sociedade a devida
atenção, e o Judiciário integra a sociedade.
Em primeiro lugar, entendo que de propaganda
não se trata e, em segundo lugar, vedar esse tipo de manifestação afronta a
Constituição Federal, nos dispositivos que cuida da liberdade de expressão, de
manifestação de pensamento. Entendo, ainda, que estamos diante da possibilidade
de as pessoas se comunicarem no seu círculo familiar, de amizade e de grupo
social emitindo opiniões. Como impedir isso?
Insisto, com a devida vênia, que é posição
um tanto quanto equivocada do nobre relator. Não consigo comungar da
possibilidade de intervirmos no pensamento humano, no cochicho entre as
pessoas, na rede entre as pessoas. Seria como se interviéssemos num almoço de
família em que o pai pede para o filho votar em alguém no período de
pré-campanha. Está fazendo propaganda antecipada? Então se o filho falar mal do
candidato do pai, estará fazendo contrapropaganda antecipada. É disso que se
trata.
Com a devida vênia, acompanho a divergência.
ESCLARECIMENTO
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Senhores Ministros, reconheço que a questão é muito complexa e
polêmica.
Ocorre que existem milhares de pessoas que
seguem determinado twitter e há formadores de opinião que emitem
pensamentos por meio do twitter que são seguidos por centenas de
milhares de pessoas. Estou apenas mostrando a complexidade dessa questão.
Muitas vezes o twitter fica
circunscrito a um círculo muito estreito, muito pequeno, mas outros não. Outros
são formadores de opinião, são jornalistas que têm twitter extremamente
extenso.
O SENHOR MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR
(relator): É o caso do candidato a Vice-Presidência da República.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: Conversar
com as pessoas do seu círculo de amizade não é propaganda. O que a lei veda
antecipadamente é a propaganda. A conversa entre pessoas é propaganda? Uma
conversa por telefone é propaganda? Uma videoconferência que se faça, que é o
mesmo sistema, a mesma tecnologia, é propaganda? As pessoas têm que ligar
aquele aparelho, cadastrarem-se e comunicarem-se numa mesma linha de
comunicação.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Digamos que um artista, um comunicador importante que tem um twitter
com centenas de milhares de pessoas comece a elogiar de forma antecipada um
possível candidato. Não afirmo nem que sim nem que não, apenas digo que a
questão é muito complexa.
Tendo em vista a complexidade da matéria,
talvez isso possa ser objeto de uma resolução que oportunamente elaboraremos.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: Mas não
teremos estrutura para intervir em todas as comunicações humanas. Twitter são
milhões de pessoas se comunicando várias vezes ao dia.
PEDIDO DE VISTA
O SENHOR MINISTRO MARCELO RIBEIRO: Senhor
Presidente, peço vista dos autos.
VOTO-VISTA
O SENHOR MINISTRO MARCELO RIBEIRO:
Senhor Presidente, transcrevo o relatório elaborado pelo e. Min. relator, que
expõe com clareza os fatos:
Cuida-se de recurso interposto por Antonio
Pedro de Siqueira Índio da Costa contra decisão que julgou procedente
representação para condená-lo à sanção de multa de R$ 5.000,00 (cinco mil
reais) por propaganda eleitoral antecipada realizada na internet via Twitter.
Na decisão recorrida (fls. 50-58), da lavra
do Min. Henrique Neves5, juiz auxiliar desta c. Corte nas eleições de
2010, consignou-se que as mensagens veiculadas na mencionada ferramenta
evidenciaram a pretensão do ora recorrente de divulgar candidatura aos cargos
de presidente e vice-presidente da República nas Eleições 2010 em período
anterior a 5 de julho, violando assim o art. 36 da Lei nº 9.504/97.
Nas razões recursais, aduz-se essencialmente
o seguinte (fls. 62-75):
a) o Twitter constitui ferramenta de
comunicação de ambiente restrito, uma vez que o acesso ao respectivo sítio e o
ato de seguir determinada pessoa dependem de exclusiva vontade do internauta;
b) os internautas não cadastrados no Twitter
somente têm acesso às 20 mensagens mais recentes de cada usuário, não sendo
possível, após determinado espaço de tempo, a pesquisa ou leitura dessas;
c) a mensagem impugnada, ainda que tenha
extrapolado os limites legais, não foi divulgada a todos os 40.676 seguidores
do recorrente por se tratar de resposta dirigida especificamente a um
internauta, a qual só pode ser recebida “pela própria pessoa que iniciou a
conversa, ou por aqueles usuários que sigam, simultaneamente, as duas pessoas
que travam a conversa” (fls. 68-69);
d) o debate online entre internautas
não pode ser considerado propaganda eleitoral, pois equivale a mero diálogo
entre duas ou mais pessoas;
e) “a resposta postada pelo twitteiro a uma pergunta de um interlocutor seu, [sic] não
pode ser considerada como ato que leva ao conhecimento geral uma candidatura e
as suas propostas” (fl. 68), uma vez que o Twitter é constituído por
comunidade de usuários previamente estabelecida;
f) a mensagem, no contexto de sua
veiculação, guarda semelhança com as entrevistas dadas a grandes meios de
comunicação, em relação aos quais o c. Tribunal Superior Eleitoral já se
manifestou no sentido de não configurarem propaganda antecipada;
g) “o tema político foi trazido pelo
internauta e não propriamente pelo recorrente, que apenas respondeu às
mensagens que lhe foram feitas” (fl. 72);
h) o reconhecimento do ato impugnado como
propaganda extemporânea violou os arts. 5º, IV, e 220 da Constituição Federal
e, por conseguinte, ofendeu a livre manifestação de pensamento e de crítica.
Ademais, a candidata Dilma Rousseff veiculou em sua página do Twitter mensagens
de teor semelhante antes de 6 de julho de 2010.
Ao fim, requer-se o provimento do recurso,
com a consequente reforma da decisão monocrática.
Contrarrazões apresentadas às fls. 78-83,
nas quais o Ministério Público Eleitoral sustenta que:
a) as mensagens impugnadas não representam
simples diálogo entre internautas e, ainda que tenham constado somente das 20 mensagens
mais recentes da página do recorrente no Twitter, podem ter sido
acessadas por milhares de pessoas, levando ao conhecimento geral o pedido de
votos formulado;
b) “não pode ser considerado mera
expressão da liberdade de pensamento o fato de um candidato a cargo eletivo
postar na internet pedido expresso de votos, por
meio de mensagem que pode ser acessada por milhares de pessoas, pois representa
um atentado direto à isonomia entre os candidatos, e por via de consequência, à
própria democracia” (fl. 82);
c) condutas praticadas por outros candidatos
na propaganda eleitoral, as quais supostamente guardam semelhança com o caso
dos autos, não são aptas a justificar os atos do recorrente na espécie.
O feito foi a mim redistribuído em
22.12.2010 (fl. 91).
O e. relator, Min. Aldir Passarinho Junior,
votou pelo desprovimento do recurso, mantendo a decisão agravada, da lavra do
e. Min. Henrique Neves da Silva.
Ressaltou Sua Excelência que “as mensagens
veiculadas na ferramenta de comunicação Twitter alcançam não apenas os
seguidores cadastrados, mas qualquer internauta que acesse o sítio, não havendo
falar, assim, em ambiente restrito”.
Destacou o entendimento do e. Min. Henrique
Neves, no sentido de que, “no caso, o representado não optou por restringir as
mensagens contidas em sua página, permitindo que qualquer pessoa, ainda que não
cadastrada no twitter, tivesse acesso ao conteúdo divulgado”.
Sobre o alcance do twitter,
consignou, ainda, o e. relator, que:
Por fim, a despeito do argumento de que nem todos
os 40.676 seguidores do recorrente foram notificados das mensagens postadas,
não há como desconsiderar a possibilidade de pesquisa e leitura dessas mediante
acesso à respectiva página no Twitter, independentemente de cadastro
prévio.
Portanto, ainda que não se possa falar em
alcance irrestrito das interações entre os usuários do Twitter, é
evidente a potencialidade da ferramenta de levar ao conhecimento geral os
diálogos nela travados.
Indicando precedentes jurisprudenciais desta
Corte, afirmou que, “presentes os elementos caracterizadores da propaganda
eleitoral, é irrelevante o meio pelo qual ocorre sua divulgação, em especial no
caso da internet, que representa fonte de divulgação de ideias e informações em
plena expansão”.
No mérito, Sua Excelência manteve a decisão
impugnada, por considerar que a mensagem divulgada “demonstra, de forma
explícita e inequívoca, a pretensão do recorrente – já escolhido em convenção
partidária – de promover sua candidatura e a de José Serra aos cargos de
vice-presidente e presidente da República nas Eleições 2010, inclusive com
menção ao slogan de campanha adotado para a eleição”.
Na sessão de 17.3.2011, após o voto do
relator, os eminentes Ministros Dias Toffoli e Cármen Lúcia votaram pelo
provimento do recurso. Em seguida, pedi vista dos autos para melhor exame.
Passo a me manifestar.
Sobre a definição do twitter, o e.
Min. Henrique Neves, prolator da decisão recorrida, ressaltou que (fl. 53)
Mesmo que várias pessoas considerem o „twitter‟
uma rede de interação, um dos seus criadores, o americano Jack Dorsey, declarou
ao jornal espanhol „El País‟ não considerar o twitter uma rede
social, mas uma ferramenta de comunicação. Do mesmo modo, outro
cocriador, Biz Stone, afirma que a ferramenta é uma rede de informações.
Estudos realizados em diversos países
concluem que a ferramenta desenvolvida está mais para um meio de difusão do
que uma conversa íntima entre amigos, ainda que não seja possível negar que
ela também apresenta, em alguns casos, características de interação que definem
uma rede social. (Destaquei)
Diante desse fato, ponderou Sua Excelência
que não se poderia considerar o twitter uma ferramenta de comunicação
restrita entre usuários previamente cadastrados, como afirmara a defesa,
porquanto as páginas de divulgação estão acessíveis a qualquer internauta,
mesmo que, não esteja registrado.
Consignou, ademais, o e. Min. relator que o
representado, ora recorrente, não optou por restringir o acesso às mensagens
postadas em sua página, permitindo, com isso, que qualquer um tivesse acesso ao
conteúdo.
Sem reparos o entendimento de Sua
Excelência.
Como bem pontuou o e. relator, Min. Aldir
Passarinho Junior, sem respaldo a alegação de que os usuários não cadastrados
somente poderiam visualizar as últimas 20 (vinte) mensagens postadas, porquanto
a opção “more” contida no final da página permite o acesso a todo o conteúdo do
microblogging.
Dessa forma, não procede a assertiva de que
as mensagens transmitidas não poderiam ser vistas por todos os 40.676 (quarenta
mil, seiscentos e setenta e seis) seguidores, sob o argumento de que teriam
sido transmitidas somente em resposta a textos enviados por determinados
usuários, que seriam os únicos que poderiam visualizar tais mensagens.
Ora, se o recorrente optou por não
restringir a visualização do conteúdo da página, como consta na decisão
agravada, não há se falar em acesso restrito somente aos interlocutores
cadastrados para os quais as respostas foram enviadas.
De todo modo, já decidiu esta Corte que
“sítios de relacionamento na internet, ainda que tenham seu acesso restrito aos
usuários, constituem meios aptos à divulgação de propaganda eleitoral
extemporânea, uma vez que são amplamente utilizados para a divulgação de ideias
e informações ao conhecimento geral” (Acórdão nº 581.730/MG, DJe de
22.3.2011, rel. Min. Aldir Passarinho Junior).
No mesmo sentido, o Acórdão nº 10.135/SP, DJe
de 28.9.2010, rel. Min. Arnaldo Versiani, do qual extrai o seguinte trecho
da ementa:
As circunstâncias de que o sítio de
relacionamentos teria acesso restrito e se limitaria a integrantes e usuários
previamente cadastrados não afastam a infração legal, uma vez que as redes
sociais na Internet constituem meios amplamente utilizados para divulgação de
ideias e informações, razão pela qual não deve ser afastada a proibição da
norma que veda a antecipação de campanha”.
Ressalte-se que nos dois precedentes citados,
a propaganda foi veiculada no orkut, cujo acesso, como é cediço, é
restrito aos usuários do serviço.
O conteúdo do twitter, no entanto,
conforme dito, tem acesso mais amplo, o que permite, inclusive, a pesquisa de
expressões utilizadas em ferramentas de busca da internet, como o google,
que fornece a página do twitter onde foi postado o assunto procurado.
A propósito, consta no site do Jornal
Folha, que “um estudo conduzido pela Harvard Business School analisa o tráfego
e perfil dos internautas e, segundo uma publicação norte-americana, indica que
o Twitter é uma mídia de difusão de informações, tal como o rádio e a
televisão, e não de conversação – como as demais redes sociais”6.
(Destaquei)
No que se refere ao conteúdo da mensagem,
acolho a manifestação do e. relator, no sentido de manter a decisão que julgou
procedente a representação. Nesse sentido, transcrevo trechos do voto de Sua
Excelência:
Entretanto, a última mensagem ensejou a
procedência da representação, com a consequente imposição de multa pecuniária.
Eis o teor da manifestação (fl. 50):
“A responsabilidade é enorme. Mas conto
com o seu apoio e com o seu voto. Serra Presidente: O Brasil pode mais”.
De fato, verifica-se que a referida mensagem
demonstra, de forma explícita e inequívoca, a pretensão do recorrente – já
escolhido em convenção partidária – de promover sua candidatura e a de José
Serra aos cargos de vice-presidente e presidente da República nas Eleições
2010, inclusive com menção ao slogan de campanha adotado para a eleição.
Por sua vez, a divulgação da mensagem pelo Twitter
– ferramenta de comunicação no âmbito da internet de evidente alcance –
teve o condão de levar ao conhecimento geral do eleitorado a iminente
candidatura.
Consoante entendimento deste c. Tribunal,
constitui propaganda eleitoral antecipada a manifestação veiculada no período
vedado por lei que leve ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada,
futura candidatura, ação política que se pretende desenvolver ou razões que
levem a inferir que o beneficiário seja o mais apto para a função pública.
[...]
Assim, a veiculação de propaganda eleitoral
em período anterior ao pedido de registro de candidatos para as Eleições 2010
violou os arts. 36 e 57-A da Lei nº 9.504/97, os quais dispõem, verbis:
“Art. 36. A propaganda eleitoral somente
é permitida após o dia 5 de julho do ano da eleição”.
“Art. 57-A. É permitida a propaganda
eleitoral na Internet, nos termos desta Lei,
após o dia 5 de julho do ano da eleição.”
Ante o exposto, com todas as vênias aos
eminentes Ministros Dias Toffoli e Cármen Lúcia, acompanho o e. relator e voto
pelo desprovimento do recurso.
PEDIDO DE VISTA
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Senhor
Presidente, a matéria é importante. As novas tecnologias que dizem respeito à
comunicação pela internet, como, por exemplo, as redes sociais, assim como os
crimes cibernéticos, são novidades que precisam ser mais bem elaboradas.
Peço vista dos autos.
VOTO-VISTA (vencido)
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Senhor
Presidente, o Ministério Público Eleitoral, pela Vice-Procuradora-Geral
Eleitoral, ofereceu representação contra o então Deputado Federal Antonio Pedro
de Siqueira Índio da Costa, que veio a ser candidato a Vice-Presidente da
República na chapa de José Serra, por ter ele veiculado mensagens com claro
conteúdo eleitoral no seu microblog no Twitter, em 4.7.2010, em
ofensa ao artigo 57-A, incorrendo assim nas penalidades do artigo 36, § 3º,
ambos da Lei nº 9.504/97.
O ora recorrente, então representado,
defendeu-se afirmando que as mensagens postadas em seu microblog se
dirigiam a pessoas previamente cadastradas (seguidores ou twitters) e
que tal consiste em troca de ideias entre pessoas certas e não propaganda
eleitoral, visto que não as levaria indiscriminadamente ao conhecimento geral.
Além disso, sustenta, o diálogo de um twitter,
de regra, é provocado por terceiro, de modo que as respostas do representado
não podem ser tidas como forma de levar opiniões ao conhecimento geral, por
isso não constituiria propaganda eleitoral, donde resulta ser inaplicável o
artigo 36 da Lei das Eleições.
Por fim, pedindo pela improcedência, refere
que as manifestações do representado foram inseridas na noite de 4 de julho,
isto é, poucas horas antes do início do período legal de propaganda, revelando
ausência de dolo.
No recesso do Tribunal, o Ministro HENRIQUE
NEVES, em 18.7.2010, ao fundamento de que a ferramenta Twitter constitui
meio de comunicação e, ainda que em alguns casos apresente características de
interação que define uma rede social, está mais para meio de difusão do que uma
conversa íntima entre amigos, julgou procedente a representação.
Disse Sua Excelência (fl. 54):
[...] a ferramenta utilizada permite que o
usuário siga a página de outras pessoas, o que significa dizer que
qualquer mensagem inserida na página seguida também será quase que
instantaneamente exibida na página do seguidor. Inversamente, isso
significa que toda e qualquer mensagem introduzida pelo usuário em sua página
será exibida em todas as páginas das pessoas que o seguem [...]. (grifo no
original)
Considerando os fatos apurados, concluiu o
Ministro que na ocasião o representado estava a seguir 897 usuários, era seguido
por 40.677 pessoas e fazia parte de 685 listas de interesse e insistiu em que,
“[...] ao invés de simplesmente interagir com um único usuário, divulgou para
outros 40.676 a mesma informação” (fl. 54) e que essa divulgação, de forma
exponencial, termina por afastar logicamente o argumento de não pretender
atingir o conhecimento geral da sociedade e o de que o acesso depende da
iniciativa e vontade do usuário. Assim, tendo em vista o teor das mensagens
combinado com a magnitude da divulgação, entendeu existente a violação. Com
base nos artigos 36-A e 57-A da Lei nº 9.504/97, impôs a multa de R$ 5.000,00.
Daí o recurso.
O recorrente reafirma que as mensagens
postadas dependem do cadastro prévio do seguidor, até porque as mensagens
oriundas daqueles não cadastrados ficam restritas aos 20 mais recentes
desaparecendo as anteriores.
De qualquer sorte, sustenta, a mensagem só
será “[...] recebida pela própria pessoa que iniciou a conversa ou por
aqueles usuários que sigam, simultaneamente, as duas pessoas que travam a
conversa” (fls. 68-69 – grifos no original), e nessa linha as mensagens não
poderiam ter sido automaticamente enviadas aos 40.677 seguidores como afirmado.
Dessa forma, o uso do Twitter, no
caso dos autos, não constituiria propaganda eleitoral vedada, além do que a
restrição proposta no ato recorrido importa em manifesta violação da liberdade
de manifestação de pensamento.
A Procuradoria-Geral Eleitoral, em
contrarrazões, reitera o pedido, assinalando mais: que a ilicitude das
mensagens tinha potencialidade de propaganda a ser vista por milhares de
pessoas.
O Ministro ALDIR PASSARINHO, relator, negou
provimento ao recurso entendendo que o alcance do Twitter e a
possibilidade prática de propaganda antecipada ficaram patenteadas, assim como
o conteúdo das mensagens reflete intuito eleitoral, e então não se pode falar
em ofensa à liberdade de manifestação de pensamento.
A Ministra CÁRMEN LÚCIA divergiu com base no
entendimento de que o Twitter porta a característica predominante de
rede social, no que foi acompanhada pelo Ministro DIAS TOFFOLI, que considera a
ferramenta um modo de “cochicho”.
O Ministro MARCELO RIBEIRO, em voto-vista, acompanhou
o Relator destacando que, segundo entende, não há restrição de acesso às
mensagens e, ao contrário, a possibilidade de se ampliar a divulgação constitui
difusão sujeita ao controle eleitoral, tudo no pressuposto de que o “[...] Twitter
é uma mídia de difusão de informações, tal como o rádio e a televisão, e
não [apenas] de conversação como as demais redes sociais”.
Pedi vista na sessão de 7.2.2012.
A minuciosa reportagem dos fatos da causa
que acabo de fazer, além de relembrar o caso aos membros da Corte, serve como
medida da apreciação das questões que se sucederam.
Com efeito, é preciso inicialmente definir
em linhas gerais a ferramenta, depois é necessário avaliá-la do ponto de vista
eleitoral e por fim apurar se constitui meio de propaganda e, nesse caso,
considerar se incidiu na vedação legal.
A informação mais objetiva sobre o Twitter,
como referido, talvez esteja na descrição da Wikipédia (http://pt.wikipedia.org/wiki.Twitter):
Twitter é uma rede social e servidor para microblogging, que
permite aos usuários enviar e receber atualizações pessoais de outros
contatos (em textos de até 140 caracteres, conhecidos como
"tweets"), por meio do website do serviço, por SMS e por softwares
específicos de gerenciamento.
As atualizações são exibidas no perfil de um usuário em tempo real e também enviadas a
outros usuários seguidores que tenham assinado para recebê-las. As atualizações
de um perfil ocorrem por meio do site do Twitter, por RSS, por SMS
ou programa especializado para gerenciamento. O serviço é gratuito pela internet,
entretanto, usando o recurso de SMS pode ocorrer a cobrança pela operadora
telefônica.
Desde sua criação em 2006 por Jack Dorsey, o Twitter ganhou extensa
notabilidade e popularidade por todo mundo. Algumas vezes é descrito como o
"SMS da Internet".
Retweet
O retweet é uma função do Twitter que
consiste em replicar uma determinada mensagem de um usuário para a lista de
seguidores, dando crédito a seu autor original. Na página de início do site
existe um botão chamado retwittear, que faz o envio automático da mensagem para
todos seguidores da pessoa. Antigamente, os usuários realizavam isto de forma
manual, acrescentando um RT ao lado da @alcunha de
quem escreveu. Quando um texto é "retweetado", o termo "RT"
aparece em negrito no início da mensagem.
Twitter List
Twitter List é um recurso disponível no
Twitter que permite ao usuário criar listas compartilháveis de usuários. O que
dinamiza a leitura dos tweets já que se torna possível ler o conteúdo postado
por grupos de seguidores.
A meu sentir, todavia, pouco importa a noção
precisa do que seja a ferramenta, pois o que interessa, sobretudo no campo
eleitoral, é se ela pode produzir os efeitos que a lei veda.
A intensa discussão travada nos autos para
definir se o uso do microblog na forma idealizada provoca a divulgação
exponencial ou sucessiva das mensagens de seguidores em grande número, a meu
juízo, parece não ter a relevância emprestada pelo ato recorrido e, por
consequência, pelos votos que agora o mantiveram.
É que a noção de propaganda tradicionalmente
adotada pela jurisprudência da Corte não se acomoda aos limites do Twitter mesmo
que alguns milhares de destinatários possam ser alcançados.
A noção clássica de propaganda, que serve de
matriz para os precedentes e para o raciocínio legal nesse tema, parte de
pressuposto diverso.
Com efeito, em acórdão muito citado (REspe
nº 16.183/MG, julgado em 17.2.2000, Rel. Ministro EDUARDO ALCKMIN) assim ficou
assentado:
Entende-se como ato de propaganda eleitoral
aquele que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a
candidatura, mesmo que apenas postulada, a ação política que se pretende
desenvolver ou razões que induzam a concluir que o beneficiário é o mais apto
ao exercício de função pública. Sem tais características, poderá haver mera
promoção pessoal – apta, em determinadas circunstâncias a configurar abuso de
poder econômico – mas não propaganda eleitoral [...].
Apesar da variabilidade dessa noção no tempo
e no espaço, como é comum no campo eleitoral, há um núcleo essencial que parece
demarcar a relevância e necessidade do controle da propaganda eleitoral, isto
é, a capacidade ou poder de divulgação a priori ilimitada. Ou, como os
especialistas denominam, a capacidade de emitir sinais segundo a fórmula “1
para „n‟”, em que, no rádio e na televisão – por isso os mais visados pela
repressão à propaganda vedada –, os telespectadores e ouvintes não são
identificáveis ou determináveis, porquanto qualquer do povo, de forma gratuita
e livre, possuindo um receptor, recebe a programação das emissoras sem
condicionante ou contrato, e assim pode ser passivamente alcançado, sem
deliberação prévia, pelo autor da informação.
Esse pressuposto de comunicação de massa
incontrolável é que deu justificativa e razão lógica para a vigilância sobre a
propaganda eleitoral e os cuidados com sua divulgação, tanto durante o período
autorizado quanto, e com mais razão, durante o período vedado.
Nada obstante, o artigo 57-B da Lei das
Eleições estabelece que a propaganda eleitoral também pode ser realizada
IV – por meio de blogs, redes
sociais, sítios de mensagens instantâneas e assemelhados, cujo conteúdo seja
gerado ou editado por candidatos, partidos ou coligações ou de iniciativa de
qualquer pessoa natural. Ou seja, conquanto considerados meios de comunicação
diversos da televisão, rádio e jornais ou revistas, a lei reconheceu potencial
significativo de divulgação do ponto de vista da propaganda eleitoral.
Por conta disso, o Tribunal teve de
enfrentar essa matéria, primeiro, no julgamento da Cta nº 1.477/DF, (Rel. p/
acórdão Ministro JOAQUIM BARBOSA, julgado em 10.6.2008), que, a despeito do
intenso debate, terminou pelo não conhecimento do pedido, com prejuízo das
discussões então iniciadas.
Em outra oportunidade, abordou o tema de
modo especifico, com respeito ao Twitter, na Rp nº 3.618-95/DF, Rel.
Ministro HENRIQUE NEVES, julgado em 29.10.2010, cujo acórdão tem a seguinte
ementa, que é ilustrativa da orientação adotada:
Eleições 2010. Propaganda Eleitoral. Twitter.
Direito de resposta. Sítios de mensagens instantâneas e assemelhados.
Possibilidade jurídica.
1. O Twitter se insere no conceito de
"sítios de mensagens instantâneas e assemelhados", previsto no art.
57-B da Lei 9.504/97, e é alcançado pela referência a "qualquer veículo de
comunicação social" contida no art. 58 da Lei das Eleições.
[...]. (grifos no original)
A leitura do inteiro teor desse julgado,
embora focado no direito de resposta, até o momento é o mais representativo da
jurisprudência da Casa e revela bem as dificuldades de compreensão e disciplina
dessas novas realidades no campo das comunicações sociais (até porque foram
criadas espontaneamente) e principalmente de ajustamento à legalidade
sustentada pelo Tribunal.
Ao interpretar o referido artigo 57-B da Lei
nº 9.504/97, o TSE assentou que o Twitter constituía meio de comunicação
social, considerou a matéria discutida como injuriosa e apenou alguém com
direito de resposta. Para tanto afirmou expressamente o pressuposto de que a
divulgação por esse meio de informação comportava a difusão de propaganda
eleitoral que justificava a resposta.
Ora, o artigo 58 da Lei nº 9.504/97 de fato
assegura “o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos
[...] por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente
inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social”. Mas parece
claro que o direito de resposta não deriva da propaganda irregular e sim da
ofensa, e a referência ao artigo 57-B pode não ser relevante para a solução.
No caso, o direito de resposta que a Corte
garantiu tinha por fundamento a afirmação gravosa, e não a propaganda
supostamente ilegal, donde não é possível deduzir – como sugere a ementa
reproduzida – que o direito de resposta justifica a afirmação de que se tratava
de propaganda eleitoral irregular.
Em resumo, a manifestação no Twitter pode
justificar direito de resposta, mas não constitui, por si só, meio de
provocação de conhecimento geral típico da propaganda eleitoral.
O que se alcança no Twitter é, pelo
contrário, um universo definido e identificável, certo e conhecido apesar de
volátil e fluido, qualquer que seja a modalidade de funcionamento, operação ou
atuação dos partícipes envolvidos, com ou sem replicação exponencial.
Por consequência, não há participação
involuntária ou desconhecida dos seguidores, os quais, pelo contrário, sempre
aderem conscientemente ao diálogo.
Basta ver, no caso concreto, que o então
candidato tinha uma conta no Twitter e se dispôs a responder a quem lhe
endereçasse indagações e que, na resposta, os demais, cadastrados ou não, mas
voluntariamente, eram seguidos pelas mensagens e réplicas.
De tudo resulta que, daqui por diante,
convém distinguir a propaganda eleitoral sujeita ao controle da Lei das
Eleições (e da lei eleitoral em geral) – isto é, aquela generalizada e indiscriminada
em face de eleitores indeterminados –, daquela que, mesmo sendo de natureza
eleitoral, não se sujeita a controle por ser este inviável, ou porque não há
como rastrear as comunicações fechadas, ou porque o controle é desnecessário,
por não constituir ilegalidade a conversa ou informações trocadas
deliberadamente entre pessoas determinadas.
O referido julgamento da Rp nº 3.618-95/DF,
assim, não serve como demonstração de que o Twitter ontologicamente
constitui meio de propaganda eleitoral no sentido tradicional de divulgação
pública e de conhecimento geral.
Por essa razão, estou persuadido de que esse
modelo de comunicação não transporta divulgação para conhecimento geral, difuso
ou incerto e indeterminado nem perturba ou diminui a lisura do esclarecimento
do eleitor.
Nesses termos, em respeito ao princípio da
tipicidade, a propaganda eleitoral gerada por essas redes não se submete ao
regime geral da Lei das Eleições, como divulgação de cunho eleitoral entre
pessoas certas, o representado e seus seguidores. Quando muito, constitui
propaganda eleitoral lícita, doméstica, caseira ou entre interessados
conhecidos e ajustados e, portanto, fora do objeto da proteção que a lei
pretendeu ao reprimir atos vedados, estando assim livre em qualquer período.
Aliás, como alguém já referiu, a realidade
caótica da internet e das redes sociais, por natureza incontroláveis, talvez
tenha contribuído muito mais para a difusão livre e democrática de ideias e
movimentos entre pessoas certas e identificáveis do que as mídias regulares
difusas e massivas, tradicionalmente ligadas, algumas vezes, a interesses
econômicos ou partidários.
A possível liberdade das redes sociais e
suas ferramentas de comunicação, em rigor, não constitui desafio à Justiça
Eleitoral porque, ao revés, constitui fator de libertação dos eleitores e
cidadãos nesses espaços, onde podem escolher mais facilmente a quem
voluntariamente aderir ou seguir e nisso prestam relevante colaboração para a
genuína democratização das eleições.
De resto, os exemplos mundo afora de
“primaveras” políticas seguramente comprovam o alcance dessas mídias e redes
sociais, e nem por isso transformam os seguidores ou aderentes em destinatários
involuntários ou indefesos como são na televisão e no rádio tradicional.
Ante tais circunstâncias, tenho que os
precedentes do TSE referidos não objetam a consideração segundo a qual o Twitter,
embora meio de comunicação social ou rede social de maior ou menor abrangência
capaz de veicular propaganda eleitoral, não pode ser definido como meio de
divulgação de propaganda eleitoral geral e indeterminada, e assim não pode ser
tido como daquelas sujeitas ao controle pela Justiça Eleitoral.
Nessa linha, com a vênia dos votos em
contrário, dou provimento ao recurso do representado para julgar improcedente a
representação da Vice-Procuradora-Geral Eleitoral.
É como voto.
ESCLARECIMENTO
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: Senhor
Presidente, participei dos julgamentos anteriores, mas confesso que gostaria de
rememorar o caso. É pena que o relator não esteja aqui para nos esclarecer.
Qual o teor da mensagem divulgada no twitter?
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Para mim,
isso não interessa. Pode ser ofensa, injúria, calúnia, difamação.
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: Ouvindo
o brilhante voto de Vossa Excelência, tive a impressão de que o seu
entendimento é o de que não estariam configurados os pressupostos de propaganda
e, além disso, o twitter não seria meio hábil.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: O fato
concreto é o que menos importa aqui.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Permito-me fazer duas observações. Primeiramente, afirmo que foi
essa a mensagem, antes do dia 5 de julho: “A responsabilidade é enorme, mas
conto com seu apoio e com o seu voto. Serra presidente: o Brasil pode mais.”
Trago duas questões à reflexão da Corte, até
porque também não tenho, ainda, convicção muito bem firmada. Sabemos que a Lei
das Eleições, no caput do artigo 36, estabelece:
Art. 36. A propaganda eleitoral somente é
permitida após o dia 5 de julho do ano da eleição.
Se bem entendi, o Ministro Gilson Dipp
questiona o fato de a propaganda feita por meio do twitter – desse microblog
– não ser propaganda por não ter o caráter de generalidade, na medida em
que se dirige a público determinado. Mas a Lei nº 12.034/2010 – a minirreforma
eleitoral –, interessantemente, em seu artigo 57-B, introduzido na Lei das
Eleições, dispõe que:
Art. 57-B. A propaganda eleitoral na
internet poderá ser realizada nas seguintes formas:
I – em sítio do candidato, com endereço
eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente,
em provedor de serviço de internet estabelecido no País;
II – em sítio do partido ou da coligação,
com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou
indiretamente, em provedor de serviço de internet estabelecido no País;
III – por meio de mensagem eletrônica para
endereços cadastrados gratuitamente pelo candidato, partido ou coligação;
IV – por meio de blogs, redes sociais,
sítios de mensagens instantâneas e assemelhados, cujo conteúdo seja gerado ou
editado por candidatos, partidos ou coligações ou de iniciativa de qualquer
pessoa natural.
O que temos, então? Temos, na redação
original da Lei das Eleições, a proibição da propaganda antecipada, por força
do seu artigo 36, ou seja, antes do dia 5 de julho do ano da eleição.
De outro lado, temos, nessa inovação
legislativa, no artigo 57-B, a expressão do legislador de que a propaganda
eleitoral pode, sim, ser feita por todos esses meios eletrônicos, inclusive por
microblogs.
É uma questão interessante. O Ministro
Gilson Dipp proferiu voto brilhante, inclusive consentâneo com os grandes
princípios constitucionais. Mas temos, aqui, um dispositivo legal a estabelecer
que a propaganda feita por meio de twitter é, sim, propaganda. E se foi
veiculada antes do dia 5 de julho, como de fato o foi, com esse conteúdo...
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Esse seria
o caso? Teria sido veiculada antes do dia 5 de julho?
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Sim. Foi veiculada antes do dia 5 de julho e atingiu, segundo a
Procuradoria-Geral Eleitoral, 40 mil pessoas.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Senhor
Presidente, preocupam-me as eleições que se avizinham e também as de 2014.
Realmente, Vossa Excelência ressaltou bem
que a própria Lei das Eleições enquadra essa espécie de propaganda. Penso que o
faz mediante o artigo 57-B.
Notamos que, no artigo 57-C, há certas
vedações, por exemplo, em relação a qualquer tipo de publicidade eleitoral
paga, as proibições quanto a pessoas jurídicas com ou sem fins lucrativos e de
propaganda quando se utilizem sítios oficiais ou hospedados por órgão ou
entidades da administração.
É interessante a matéria, apenas reflito em
voz alta, pois não tenho voto, uma vez que já se pronunciou aquele que ocupou a
cadeira em minha ausência. Mas, no artigo 57-G, consta que mensagens eletrônicas
enviadas por candidatos, partidos ou coligações, por qualquer meio, devem
dispor de mecanismo a permitir o descadastramento pelo destinatário. Portanto,
esse tipo de publicidade tem disciplina na Lei nº 9.504/1997.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI (presidente):
Vossa Excelência chamou a atenção para o artigo 57-C, que é extremamente
importante. E eu temo, data venia, sem querer antecipar o meu voto, mas
tão somente fazendo uma reflexão em voz alta...
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Se Vossa
Excelência me permite, somente para concluir, acredito que – por isso perguntei
a Vossa Excelência a época do implemento da propaganda –, se realizada antes do
dia 5 de julho, realmente ficou configurada a propaganda eleitoral antecipada.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Seguramente foi antes do dia 5 de julho. E a mensagem, do ponto
de vista do conteúdo, era: “A responsabilidade é enorme, mas conto com seu
apoio e com seu voto. Serra presidente, o Brasil pode mais.”
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Senhor
Presidente, quero apenas fazer algumas observações, pois já votei.
O twitter não pode ser controlado,
com direito de resposta, nos termos tradicionais. E por uma razão: como eu
expus em meu voto, o twitter é uma conversa que, em vez de se dar numa
mesa de bar tradicional, ocorre numa mesa de bar virtual. Conversa-se com as
pessoas sabendo quem está cadastrado em seu twitter.
Nós vamos proibir as pessoas de se
manifestarem?
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Mas, antes
das eleições e visando ao sucesso na caminhada, mesmo que a lei fixe
balizamento temporal para o implemento?
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Eu
pergunto: nós vamos impedir que as pessoas sentem-se numa mesa de bar e se
manifestem? Não vamos.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Não. Mas
não é o caso.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: O twitter
é isso, Ministro Marco Aurélio. Quem tem twitter sabe que ali se
conversa o tempo todo.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Por
enquanto o legislador ainda não cuidou de disciplinar as conversas de bar!
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Não. Mas,
no caso, temos de levar em consideração a maneira como se passa, respeitando os
votos diversos, obviamente.
O artigo 57-B dispõe que será permitida a
propaganda eleitoral na internet após o dia 5 de julho. O inciso IV, citado,
estabelece:
“Art. 57-B. A propaganda eleitoral na
internet poderá ser realizada nas seguintes formas:
[...]
IV – por meio de blogs, redes sociais,
sítios de mensagens instantâneas e assemelhados, cujo conteúdo seja gerado [porque
no blog há realmente] ou editado por candidatos [não há edição, há uma conversa
no twitter, é diferente de uma conversa], partidos ou coligações ou de
iniciativa de qualquer pessoa natural”.
Se se der, por exemplo, Ministro Marco
Aurélio, o direito de resposta, pode haver milhares de pedidos de direito de
resposta, impossibilitando até que a Justiça Eleitoral funcione. Isso porque
poderá haver 40 milhões de pedidos, por exemplo. E para se cumprir basta, na
sequência, lançar vários pedidos sem que se cumpra a decisão.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: O
legislador nos passou a responsabilidade por meio do artigo 57-D.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Aquele
crítico, aquele seguidor que não concordou com a ideia do seguido pode, sim,
criticar e replicar com muito mais intensidade e rapidez A SENHORA MINISTRA
CÁRMEN LÚCIA: Se a Justiça Eleitoral decidir no sentido do direito de resposta,
poder-se-á frustrar isso com absoluta facilidade.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Foi aplicada multa.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: No caso é o
blog e a rede social...
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Está
previsto no artigo 57-D de forma explícita. Como chegaremos ao deferimento é
outra questão, considerados os fatos expostos no processo.
Preocupa-me muito, Senhor Presidente,
estarmos a versar propaganda, que não deixa de ser eleitoral, ocorrida em época
em que há vedação.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Por um meio, Ministro Marco Aurélio, penso eu, que a própria Lei
das Eleições define como hábil para veicular propaganda eleitoral.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Exatamente.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Não estaríamos negando vigência ao que o legislador definiu como
meio para veicular propaganda, mas negando vigência, a meu ver, aos artigos 36,
57-B e 57-C. Eu tenho impressão, Ministro Gilson Dipp, de que Vossa Excelência
admitiu o direito de resposta por ofensa, não é isso?
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: A ofensa pode
ser objeto de resposta em qualquer meio. No caso, não é resposta, mas o meio.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): No caso, aplicou-se multa de cinco mil reais.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: No caso, o
problema é a propaganda e não a ofensa.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Só se aplicou a multa de cinco mil reais.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: São pessoas
certas, determinadas e que se expressam, bem ou mal, voluntariamente. Queremos
manter a massa ignara, sujeita a pressões políticas?
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: A questão
não é essa, mas o momento para veicular-se verdadeira propaganda eleitoral.
Concordo com Vossa Excelência.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Eu posso
ligar para quem bem entender. Como a Justiça Eleitoral irá me proibir de gastar
determinado valor com telefonemas?
Há mais: é um meio de politização. O twitter
vale muito para os jovens que ainda estão formando a sua consciência
eleitoral e política.
Em meu modo de ver, com todo o respeito,
estamos tolhendo o direito de informação e de esclarecimento de uma parcela da
população que quer voluntariamente conhecer.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Ministro
Gilson Dipp, Vossa Excelência me permite um aparte?
Há mais: o artigo 57-D dispõe sobre
manifestação de pensamento. Penso que este é um caso de liberdade de
manifestação para quem está começando.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: A Justiça
Eleitoral ficará enfraquecida quando não puder atender uma representação por
absoluta falta de meios.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Essa é
outra questão.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: É outra
questão. Mas o rádio e a televisão atingem a pessoa passivamente. Onde eu
estiver, recebo aquela gama de propaganda.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: É possível
transmitir-se, mediante o rádio e a televisão, propaganda eleitoral antes de 5
de julho? Não.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Foi veiculada
quatro horas antes de fechar. À meia-noite já era propaganda legal.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Imaginemos, então, um artista, um jogador de futebol, um atleta
que tenha 500 mil seguidores, que seja candidato e faça propaganda fora do
período autorizado. Há um desequilíbrio, uma disparidade de armas.
O SENHOR MINISTO GILSON DIPP: Qual o
interesse da Lei Eleitoral?
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Se levarmos
a situação às últimas consequências, esse grande artista, ou grande figura
pública, mesmo no período eleitoral, consegue carrear votos sem problema
nenhum.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: O jogador de
futebol concede entrevista todos os dias no rádio. Se for candidato, ele
estaria fazendo propaganda?
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Se esse for o critério, a TV a cabo, suponhamos, possui um número
restrito de assinantes.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: A TV a cabo
é uma concessão de serviço público, portanto está regulamentado por outros
meios.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Sim, mas é uma suposição. O raciocínio é o mesmo.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: O servidor do
twitter paga pelo menos a internet. Isso é voluntário e,
voluntariamente, então, pode criticar, receber informação. São pessoas certas e
identificáveis. Não importa o número. Se quisermos saber quem são os 40 mil
seguidores, saberemos. Nesse caso, veda-se, inclusive, a liberdade e a
identificação.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Concordamos
quanto a isso. A implicação, a meu ver, está no momento da feitura da
propaganda. O próprio artigo 57-G viabiliza a utilização da internet, desde que
o sistema permita o descadastramento do destinatário. Mas fazer propaganda
antes de 5 de julho é algo muito sério.
VOTO
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: Senhor
Presidente, apanhei os autos para visualizar melhor o teor da mensagem e, para
melhor refletir, a lerei novamente:
[...] A responsabilidade é enorme. Mas conto
com seu apoio e com o seu voto. Serra presidente: o Brasil pode mais.
[...] Vou dar tudo de mim, vamos para as
ruas eleger Serra presidente.
[...]
[...] A mobilização aqui na rede fará
diferença, conto com você.
[...] Juntos aqui na rede faremos a
diferença.
[...] Conto com você!
Então, pergunto-me, Senhor Presidente: esse
teor de mensagem foi divulgado apenas para seguidores? Parece que não.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Para os
seguidores, a mensagem seria inócua.
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: Ela foi
nitidamente encaminhada para qualquer pessoa, que seria atingida de forma
involuntária, isto é, querendo receber a mensagem ou não. Fosse de forma
voluntária, não seria necessário divulgar o teor dessa mensagem em termos
despersonalizados como está aqui.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: O seguidor
sabe bloquear mensagens e poderá fazer isso com aquelas que não quiser receber.
Assim está a voluntariedade.
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: O twitter,
na verdade, utiliza-se da mesma forma de divulgação de mensagens que o e-mail,
pela internet. Há a diferença de que, se a pessoa faz isso no período eleitoral
permitido e, se alguém recebe esse e-mail e não quer receber, a pessoa é
obrigada a descadastrá-la imediatamente, sob pena de incidência de multa.
Se alguém, no entanto, dispõe de cadastro de
algumas pessoas, por exemplo, de órgãos e transmite mensagens via e-mail, não
é essa uma forma de propaganda? Claro que sim. O que interessa, a meu ver, é o
teor da mensagem, se ela constitui propaganda.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Parece que
todo mundo é analfabeto. Desculpe-me, Ministro Arnaldo Versiani. O voluntário
que quer aderir e ouvir procura, segue uma pessoa identificável e certa. Será
que só a Justiça Eleitoral é dona da moralidade e da propaganda vedada ou não?
Penso que seria um retrocesso enorme.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Por que não
admitir a propaganda por outros meios antes de 5 de julho?
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: Aliás,
essa é a questão. Todos nós, que participamos de seminários e encontros, somos
favoráveis à antecipação do período de propaganda, porque sabemos que, em
termos gerais, a propaganda se dissemina durante período não eleitoral. Quando
se realiza a eleição, já no ano seguinte, a campanha para a próxima eleição
está nas ruas.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Para aquelas
pessoas genericamente não identificáveis, massivamente atingidas.
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: Sim. O
meu raciocínio é o seguinte: as pessoas que ocupam cargos públicos acabam tendo
um benefício maior exatamente porque são seguidas e acompanhadas pelos jornais
e pela televisão. Então, essas pessoas acabam tendo visibilidade maior do que
aquelas que não dispõem desses meios. Esse é um problema, a meu ver, de caráter
legislativo. O que todos dissemos foi que a campanha deveria ser permitida.
A consulta a que Vossa Excelência fez
referência, da qual não participei, teve como relator originário o Ministro Ari
Pargendler – relator também das instruções de 2008, quando a internet ainda
estava num período sem tanta utilização. Foi formulada essa consulta e o
Ministro Ari Pargendler trouxe voto minucioso, tentando estabelecer em que
condições a propaganda seria permitida ou não.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: O Ministro
Ayres Britto refutou todas.
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: A
maioria do Tribunal, capitaneada pelo Ministro Ayres Britto, entendeu que não
seria possível restringir a propaganda via internet pelas mesmas razões que
agora Vossa Excelência e a Ministra Cármen Lúcia bem expõem, até pela
dificuldade de exercer o controle e a fiscalização.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Mais do que
por dificuldade, pela inocuidade. As pessoas usam essas ferramentas.
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: Exato.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Então,
buscando o espírito da lei, o mesmo dispositivo, o artigo 57-D, afirma:
“Art. 57-D. É livre a manifestação do
pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede
mundial de computadores – internet, assegurado o direito de resposta, nos
termos das alíneas a, b e c do inciso IV do § 3o do art. 58 e do 58-A, e por
outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica”.
Porém, levando em consideração, obviamente
(tenho certeza de que Vossa Excelência está levando em consideração e o
Ministro Lewandowski também), aquilo que o príncipe dos hermeneutas, Carlos
Maximiliano, dizia: a lei interpreta-se inteligentemente, buscando a sua
eficiência.
Como dar eficiência a uma norma e pensar que
esse é seu espírito com o número de twitters em funcionamento de que
temos notícia? Não é possível dar esse direito de resposta, senão a Justiça
Eleitoral faria apenas isso.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Mas nesse caso é uma multa.
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: Essa é a
mesma restrição que acontece com o uso da internet em geral. Aqueles que
participaram da propaganda presidencial, principalmente os ministros
auxiliares, tiveram imensa dificuldade.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Eu não
participei do início da discussão e por isso pedi vista, mas essa discussão é
boa, até para que a população, o cidadão, o eleitor conheçam a posição do
Tribunal Superior Eleitoral.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Claro.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Mas o cidadão pode se comunicar antes de 5 de julho. O candidato
é que não pode.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: O candidato
não é o ...
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Essa é a vedação que o legislador estabeleceu. Ele entendeu que a
propaganda é feita por vários meios tradicionais e, agora, também pela internet
e por microblogs, como o twitter.
Considerando essa situação um meio de
propaganda e estabelecendo prazo limite antes do qual não se pode fazer
propaganda, estabeleceu-se para os contendores uma proibição de veicular
matéria de natureza eleitoral antes desse período e por esse meio.
Para mim, é muito claro, a menos que
declaremos a inconstitucionalidade incidental desses dois dispositivos.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Mas já
decidimos, numa resolução há pouco aprovada, exatamente o contrário à letra da
lei, e ela não foi declarada inconstitucional.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Mas aqui
não é o caso.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: E aqui não
seria o caso, pelo amor de Deus! É uma interpretação apenas.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): A lei é taxativa, data venia, com relação a...
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: Aquela última
resolução também era taxativa. Exclusivamente!
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Esse caso não está em discussão. Eu sei que há um pedido de
reconsideração e vamos examinar essa questão.
O SENHOR MINISTRO GILSON DIPP: A situação
serve para os dois lados. Esse é o problema.
O SENHOR MINISTRO ARNALDO VERSIANI: Sem
dúvida. Neste caso, penso que o que fortaleceu a posição de que era uma rede
livre foi exatamente a resposta dada pelo Tribunal Superior Eleitoral à
referida consulta. Aliás, foi o fato de o Tribunal não ter respondido àquela
consulta, entendendo que a internet seria um campo livre, um meio livre de
divulgação e propagação de ideias, repito, até pela dificuldade de exercer o
controle, verificando excessos e aplicando eventuais punições.
No ano seguinte, porém, o Congresso
Nacional, por meio da minirreforma da Lei Eleitoral, estabeleceu um capítulo
destacadamente, regulando a forma de propaganda pela internet. Inclusive o
próprio Ministro Ari Pargendler já cuidava de estabelecer espécie semelhante de
regras na resposta à consulta.
Logo, Senhor Presidente, penso que – podemos
criticar e estamos criticando em alguns encontros dos quais estamos
participando – essa regulamentação do uso da internet pode levar a esse estado
de possível ineficácia, atribuindo, inclusive, maior serviço à Justiça
Eleitoral para coibir abusos, dando o direito de resposta, etc.
O que eu quero dizer, Senhor Presidente, é
que a internet apresenta enorme dificuldade. Aqueles fiscais que acompanharam a
eleição presidencial sabem disso. Criam-se sites, destroem-se sites,
ofendem-se candidatos em determinados sites e a Justiça Eleitoral não
consegue acompanhar ou fiscalizar. Parece inviável, mas essa foi a opção
legislativa. O legislador criou regras.
Nossa indagação, no momento, contudo, é o
inverso. Diante dessa introdução legislativa, nós vamos admitir que outros
meios de comunicação e de redes sociais estejam liberados? Não.
Enquanto o Congresso Nacional não
estabelecer de forma diversa, nós temos de entender que todos esses meios de
comunicação e de redes sociais estão incluídos nessa proibição. Por outro lado,
Senhor Presidente, também quero deixar claro que a propaganda eleitoral não se
exerce só pela rede, pela televisão e pelo rádio. A propaganda eleitoral
antecipada é caracterizada, às vezes, por um outdoor na rua ou por um
adesivo no carro.
Então, não se pode imaginar que apenas essa
forma de propaganda eleitoral, na televisão e no rádio, é nociva. O que se
proíbe é a propaganda antecipada. É uma opção legislativa nefasta? Talvez seja.
Precisamos ampliar o espectro dessa
propaganda antecipada, para possibilitar a sua divulgação? Acredito que sim.
Exatamente para permitir que outras pessoas que não tenham acesso à mídia
possam divulgar as suas ideias.
Mas entendo que, no caso, pela leitura que
fiz do texto, Senhor Presidente, não tenho como dissociar essa mensagem de
forma que atinja apenas a pessoa diretamente seguidora. E, pelo que ouvi nos
debates, se são 40 mil seguidores, salvo engano haveria ainda 60 mil outros não
seguidores, com a mera tecla de re-twitter, e outro re-twitter.
Imagino um jornal que, por acaso, divulgue
mensagem de determinado pré-candidato dizendo que ele, em seu twitter,
postou determinada mensagem e que essa notícia seja divulgada, por exemplo,
numa coluna social. Isso não é forma de propaganda? Isso não atinge tantas
pessoas quantas estão na internet? Não vejo como distinguir essas hipóteses.
Penso que é difícil o controle a ser
exercido pela Justiça Eleitoral, constitui atividade penosa, como o é em
relação à internet, aos orkuts e a outras redes sociais. Mas, no caso
concreto, Senhor Presidente, o teor da mensagem me deixou absolutamente
convencido de que não foi outra intenção a não ser fazer propaganda fora do
período permitido e, por isso, peço vênia à divergência para acompanhar o
relator.
VOTO
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Senhores Ministros, peço vênia à divergência, pelas razões que já
veiculei, para negar provimento ao recurso.
Não me impressionam, data venia, as
dificuldades técnicas, porque, se assim fosse, a persecução da pedofilia pela
internet seria impossível. Existem crimes hoje praticados pela internet que são
perfeitamente reprimidos com as novas tecnologias que existem à disposição,
enfim da Polícia Federal do Brasil, das várias polícias que existem no mundo e
outros meios repressivos.
Assim, frisando exatamente esse aspecto de
que não se está, de forma alguma, aqui cerceando o direito de comunicação, de
informação, porque os particulares, as pessoas comuns, os cidadãos que não
estiverem envolvidos no pleito eleitoral podem se comunicar à vontade. O que
não pode é o candidato, partido político ou qualquer outro envolvido no pleito
divulgar uma propaganda eleitoral antes de 5 de julho por esse meio, que o
legislador, por meio da minirreforma eleitoral, definiu como meio hábil para
veicular propaganda.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Senhor
Presidente, se Vossa Excelência me permite, quero realçar que essa decisão é importante,
porque significa que o Tribunal Superior Eleitoral decidiu que o uso do twitter
pelo candidato antes da data legalmente permitida para propaganda constitui
ato ilícito.
Quero deixar em bom português exatamente o
que decidimos, porque a sessão foi interrompida, e para que tenhamos a boa
vontade dos candidatos a candidatos que não usem twitter antes da data
permitida, em colaboração à sociedade e à Justiça Eleitoral.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Realmente, estamos dando estrito cumprimento à Lei 12.034/2010.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Não estou
discutindo a lei. Apenas estou realçando para que fique claro o que foi
decidido.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Estamos decidindo, por maioria, que a propaganda veiculada pelo twitter
antes de 5 de julho é vedada ao candidato, aos partidos políticos e àqueles
que estão envolvidos nas eleições.
O Ministro Arnaldo Versiani leu o que foi
veiculado com muita ênfase e muita contundência e eu, mais uma vez, na
releitura e ouvindo novamente Sua Excelência, fiquei impressionado com a
contundência da mensagem política.
A eminente Vice-Procuradora-Geral Eleitoral
confirma que foram atingidas 40 mil pessoas seguidoras, numa verdadeira
progressão geométrica, porque esse número de pessoas pode ser ampliado
indefinidamente.
A SENHORA VICE-PROCURADORA-GERAL ELEITORAL
SANDRA CUREAU: Senhor Presidente, evitei me manifestar durante o julgamento
justamente porque não era o momento, mas, lendo sobre o twitter na
internet, verifiquei que é um instrumento muito usado por empresas para
divulgar os seus produtos.
Vi também que, em um artigo publicado em
2009 no New York Times, uma jornalista afirmou essa utilidade produtiva
do twitter dizendo que, em uma empresa determinada, os clientes
costumavam reclamar deixando notas em uma caixa de sugestão e agora eles enviam
as reclamações e sugestões via twitter.
Então, na verdade, não é uma conversa de
bar, é muito mais do que isso.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: Pode ser
usado para outras coisas, doutora Sandra Cureau. Mas é, sim, a mesma coisa e o
mesmo diálogo. Quem usa twitter sabe disso.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI
(presidente): Penso que a discussão foi muito enriquecedora, honra as tradições
desta Corte e eu cumprimento o Ministro Gilson Dipp pelo voto muito
substancioso que trouxe e penso que essa discussão, embora o desfecho tenha
sido, enfim, tomado por maioria de votos, pode, eventualmente, ensejar até uma
mudança legislativa.
Foi muito importante também a Ministra
Cármen Lúcia enfatizar com muita clareza o que foi decidido. Cumpre, então, aos
legisladores, eventualmente, alterar essas disposições, que são, a meu ver,
taxativas.
Agradeço a participação de todos, inclusive
da doutora Sandra Cureau.
DJE de
21.5.2012.
_________________
1. Processo
inicialmente distribuído à Min. Nancy Andrighi e decidido pelo Min. Henrique
Neves em virtude do que dispõe o art. 16, §§ 5º e 9º, do RI-TSE, verbis:
Art. 16. A distribuição será feita entre
todos os ministros.
[...]
§ 5º Nos processos considerados de natureza
urgente, estando ausente o ministro a quem couber a distribuição, o processo
será encaminhado ao substituto, observada a ordem de antiguidade, para as
providências que se fizerem necessárias, retornando ao ministro relator assim
que cessar o motivo do encaminhamento. Ausentes os substitutos, considerada a
classe, o processo será encaminhado ao integrante do Tribunal, titular, que se
seguir ao ausente em antiguidade.
[...]
§ 9º Os feitos de natureza específica do
período eleitoral poderão ser distribuídos aos ministros substitutos, conforme
dispuser a lei e resolução do Tribunal.
2. REspe nº
15.447/CE, Rel. Min. Eduardo Alckmin, DJ de 6.11.98; AG nº
2.088/PR, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 24.3.2000; REspe nº
16.826, Rel. Min. Fernando Neves, DJ de 23.3.2001.
3. Art. 5º
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
[...]
IV – é livre a manifestação do pensamento,
sendo vedado o anonimato;
4. Art. 220.
A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob
qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado
o disposto nesta Constituição. 5. Processo inicialmente distribuído à
Min. Nancy Andrighi e decidido pelo Min. Henrique Neves em virtude do que
dispõe o art. 16, §§ 5º e 9º, do RI-TSE, verbis:
Art. 16. A distribuição será feita entre
todos os ministros.
[...]
§ 5º Nos processos considerados de natureza
urgente, estando ausente o ministro a quem couber a distribuição, o processo
será encaminhado ao substituto, observada a ordem de antiguidade, para as
providências que se fizerem necessárias, retornando ao ministro relator assim
que cessar o motivo do encaminhamento. Ausentes os substitutos, considerada a
classe, o processo será encaminhado ao integrante do Tribunal, titular, que se
seguir ao ausente em antiguidade.
[...]
§ 9º Os feitos de natureza específica do
período eleitoral poderão ser distribuídos aos ministros substitutos, conforme
dispuser a lei e resolução do Tribunal.
6. Matéria
divulgada em 5.6.2009, no endereço: http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u576656.shtml